segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

A ARTE DE JUNTAR A LEVEZA COM A DENSIDADE

JORGE BICHUETTI

A ARTE DE JUNTAR A LEVEZA COM A DENSIDADE

                Disse-me alguém um dia que meu maior defeito era a seriedade exessiva. E, realmente para o mundo atual esse defeito chega a ser insuportável. Assim esse amigo cujo blog simplesmente me apaixona vai me permitir  colocar alguma de suas lindas poesias ou crônicas magníficas no meu blog, dando-lhe alguma leveza. Quando fui chamada para fazer parte da fraternidade branca não pensava estar um dia  no ano 2.011 e   na responsabilidade  de ser uma das divulgadoras das grandes mudanças que iriam ocorrer.
               Meu amigo Jorge,  essa sua crônica  é bonita demais e não posso deixar de postá-la aqui hoje.

TRABALHO, DESEJOS E SONHOS
                                                                            Jorge Bichuetti

Nunca pensei que a vida fosse um mistério... Viver e amar, caminhar e sonhar... Me pareciam tão naturais que nunca, de fato, disse o quanto era feliz no meu trabalho.
O trabalho com a loucura, com os portadores de sofrimento mental, tem sido, para mim, uma escola de liberdade e solidariedade, de paixão e com-paixão, de cidadania e direitos humanos...
Crescemos com medo da loucura... Era o perigo na esquina, o medo imposto pelos que cuidavam de nós...
A loucura, todavia, é expontaneidade e magia, ternura e poesia... O avesso do mundo sisudo é sério que mata, violenta e explora; exclui e marginaliza; nos impede de brincar, desejar e sonhar...
Com eles, descubro  lágrimas e sorrisos, espinhos e flores, a rede de balanço e os passos febris e mágicos de uma nova dança.
Os loucos deliram; os normais, mentem...
Na mentira, reconheço as velhas e caducas manipulações mistificadoras...
Nos delírios, o virtual... As utopias, as paragens paradísiacas dos sonhos...
Pichón-Riviere dizia que havia "locos lindos" e "locos de mierda".
Loucura é diferença, singularidade, multiplicidade e devir...
Um perigo real para um mundo que nega o novo.
E, assim, a diferença é esquartejada pelo instituído que a teme na sua potência instituinte de desbravar novos alvoreceres.
Negado e excluída, ela se vê capturada pelo adoecimento que a engaiola nos padrões dominantes...
Vira vida silenciada, mortificada, inibida e dilacerada...
Cuidamos desta dor...
E cuidamos, fomentando a construção produtiva e inventiva de caminhos para os desejos e sonhos que moram nas entranhas da aurora...
Há na loucura uma vivência de fronteira... Uma encruzilhada...
Um caos... E no redemoinho deste caos se misturam os detritos do nosso passado e o adubo fértil das florescências do nosso porvir.
O caos é criativo: caosmose...
Já dizia o livro santo que os que miram fixos para os escombros do ontem se petrificam, viram estátuas de sal.
Cada dor é uma pedra no meio do caminho...
Alguém ali a colocou, outros passaram e não a tiraram; e nós, muitas vezes, somos incapazes de carregá-la...
Cuidar, então, é bifurcar, ramificar, contornar e, deste modo, derivar novos caminhos na direção de um novo amanhecer e de novos horizontes, para além da nossa história de para além de nós mesmos...
Trabalhamos com o humano na luta por uma vida de direitos mais que humanos...
Por tudo isso, digo: nos entres das relações com a loucura há uma vida, mais vida do que essa vida tão impregnada de morte...
Há uma vida emergente... Uma vida que se fossemos nomeá-la a chamaríamos de vida-esperança...

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